No universo empresarial, é extremamente comum a ocorrência de desavenças entre sócios, o que muitas vezes pode levar ao desinteresse de permanecer na sociedade. Nestes casos, existe a possibilidade de exercer o chamado “direito de retirada”, objeto de análise adiante.
O artigo 1.029 do Código Civil dispõe que “além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa”. Este dispositivo, contudo, está inserido no capítulo que versa sobre as sociedades simples.
No capítulo do Código Civil reservado às sociedades limitadas, o artigo 1.077 prevê o direito de retirada apenas do sócio que dissentiu de modificação do contrato, fusão ou incorporação da sociedade. Entretanto, o artigo 1.053 estabelece que “a sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples”. Ou seja, aplica-se às sociedades limitadas a regra do artigo 1.029, que prevê o direito de retirada imotivada.
Importante registrar que, com a expressão “retirada imotivada”, não se pretende sugerir que o sócio retirante não tenha motivos para se retirar da sociedade, mas sim que os seus motivos não estão expressamente previstos, no contrato ou na lei, como causas de retirada.
Diz-se, também, “retirada imotivada” pelo simples fato de que o sócio insatisfeito não é obrigado a justificar sua retirada, que é respaldada pela própria Constituição Federal, a qual estabelece que “ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado” (artigo 5°, inciso XX).
Sendo assim, o sócio de uma sociedade empresária limitada pode se retirar de maneira imotivada com fundamento nos artigos 1.029 e 1.053 do Código Civil e no artigo 5°, inciso XX, da Constituição Federal.
Questão bastante controversa, porém, é a possibilidade de exercício do direito de retirada em caso de sociedade empresária limitada cujo contrato social estabelece a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima (e não da sociedade simples), conforme permissivo do art. 1.053, parágrafo único, do Código Civil.
Nestes casos, parte considerável da doutrina e da jurisprudência consideram inaplicável o artigo 1.029 do Código Civil e, consequentemente, o direito de retirada imotivada, visto que a Lei 6.404/79 (Lei da Sociedade Anônima) permite a retirada apenas ao sócio dissidente na aprovação de determinadas matérias (fusão, incorporação, mudança do objeto social, cisão).
Todavia, apesar das discussões existentes a esse respeito, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça se sedimentou no sentido de ser aplicável a regra do artigo 1.029 do Código Civil às sociedades limitadas, mesmo com regência supletiva da Lei 6.404/79, visto que o direito de retirada imotivada decorre da liberdade constitucional de não permanecer associado (em razão do já mencionado artigo 5°, inciso XX, da Constituição Federal), além de o artigo 1.089 do Código Civil estabelecer sua aplicação subsidiária nas omissões da Lei 6.404/79.
Portanto, conclui-se que, em se tratando de sociedade empresária limitada, o direito de retirada imotivada é uma garantia constitucional, podendo ser exercido mesmo em caso de regência supletiva da Lei 6.404/79, bastando, para tanto, obedecer ao procedimento previsto no artigo 1.029 do Código Civil, notificando os demais sócios com antecedência mínima de sessenta dias.
Interessante mencionar que, após o recebimento desta notificação, os demais sócios poderão, no prazo de trinta dias, optar pela dissolução da sociedade, conforme disposição do artigo 1.029, parágrafo único, do Código Civil.
Por fim, após a retirada, salvo disposição contratual expressa em sentido contrário, o sócio retirante terá direito à liquidação de sua quota – com base na situação patrimonial da sociedade à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado -, que deverá ser paga em dinheiro no prazo de noventa dias (art. 1.031, caput e § 2° do Código Civil).
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